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Ser ou não ser: o teatro na escola como ferramenta de autoconhecimento

Uma arte milenar como o teatro, originada na Grécia Antiga, por volta do século VI a.C.,  também pode ser ferramenta para potencializar projetos educativos. Ao permitir que crianças e adolescentes desenvolvam habilidades como expressividade verbal e corporal e criatividade, assim como o exercício do diálogo, a linguagem teatral apoia na interação de estudantes com o seu círculo social e, indo além, com o mundo em geral. 

No Brasil, a Lei 13.278 incluiu o teatro como uma disciplina obrigatória da educação básica. A medida, publicada em 2016, alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que entre os conteúdos relacionados à área artística previa a obrigatoriedade apenas do ensino de música. A partir de sua publicação, as escolas tiveram cinco anos para se adequar à nova realidade.

“Não há dúvida de que a prática teatral é sempre recorrente como ferramenta pedagógica nos espaços educativos, principalmente porque o teatro tem o potencial de jogar com o corpo e a imaginação, de ser um acontecimento, e por meio desse movimento transformar as ações pedagógicas em ações criativas”, aponta Suzanne Guimarães, professora de teatro com experiência de 10 anos em escolas de educação básica no Maranhão. “Isso permite ao aluno criar a autonomia necessária para se conectar com seu corpo, voz, respiração e emoções.”

Teatro na escola: senso de ser

Como destacado pela docente, para além de ser uma importante ferramenta de conexão com o mundo ao seu redor, o teatro tem um enorme potencial de conectar o estudante consigo mesmo, explorando competências como autonomia e autoconhecimento de forma singular. Afinal, ao interpretar personagens em uma peça de teatro, os estudantes podem se conhecer melhor e descobrir suas potencialidades e fragilidades. 

Ainda, como apontado pela artista e arte educadora Allexandra Hayram, o teatro, “por ser resultado de um trabalho em grupo, de interação entre os estudantes”, é uma ferramenta que apoia na formação de novos laços de amizade e, consequentemente, na redução de problemas comuns ao ambiente escolar, como bullying, opressão, homofobia e racismo.

Criadora do DespertArte, iniciativa que conecta oficinas de teatro com o desenvolvimento socioemocional, Allexandra reflete sobre a própria trajetória ao lembrar do bullying que sofreu – inclusive da própria professora – durante o seu período escolar, nos anos 1980. “Hoje, como produtora de projetos socioemocionais, entendo a importância de se implantar nas escolas métodos, atividades e estudos que despertem o senso de ‘ser’ de cada indivíduo”, afirma. “E para isso, o teatro é uma excelente ferramenta, porque promove socialização, trabalhando empatia, autoconfiança, comunicação e autoconhecimento.”

Jogos teatrais

Em suma, os aprendizados derivados do processo teatral estimulam que as crianças e jovens aprendam a expressar seus desejos e medos, aspecto que é fundamental para o desenvolvimento socioemocional.

“O teatro manifesto na escola é decorrente de um processo singular. Precisa ser apresentado aos estudantes como um espaço para experiências práticas, onde através dessa condução, possam não apenas conhecer os elementos básicos da linguagem teatral, mas se permitir ao protagonismo da sua própria aprendizagem”, observa Suzanne. 

Em sala de aula, por meio de jogos teatrais – um recurso didático de característica cooperativa, reflexiva e emancipadora -, a professora estabelece espaços de aprendizado para que seus alunos desenvolvam descobertas e explorem o corpo em sua totalidade. “A prática teatral precisa ser contínua e constante. Ao longo do ano, realizo muitas ações importantes, feitas com, para e pelas crianças, e vejo o quanto a arte se revela de forma grandiosa, ecoando o potencial transformador do teatro.”

Teatro e conscientização social

Durante as oficinas teatrais para escolas, o projeto Despertarte também utiliza a técnica do Teatro do Oprimido, criada pelo dramaturgo Augusto Boal, que sistematiza exercícios, jogos e técnicas teatrais que buscam a desfiguração física e intelectual de seus praticantes, além de uma democratização do fazer artístico.

“Ao aliar teatro e ação social, as oficinas conscientizam as crianças e jovens sobre as situações que os oprimem, assim como entender situações em que são os verdadeiros opressores”, explica Allexandra. “Dessa forma, os estudantes refletem por meio de cenas em que eles mesmos irão construir as soluções para os problemas sociais enfrentados no dia a dia, em especial no período escolar.”

De maneira utópica, o teatro pode também ensinar que outras formas de vida em sociedade são possíveis. “Por isso, essa prática tão antiga continua sendo muito importante para o contexto atual. Afinal, ela permite que possamos nos expressar, contar histórias e crescer por meio da arte. O teatro possibilita aprendizados que vão muito além do currículo pedagógico e, certamente promove ensinamentos que serão levados por toda a vida”, finaliza Alexandra.

Autor: Danilo Mekari 

* Conteúdo produzido e editado pelo Porvir

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