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Como criar espaços para estimular o desenho e a pintura na escola a partir da abordagem de Reggio Emilia

Quando se pensa em preparar o espaço para o ensino de artes é inevitável não pensar em Reggio Emilia. Desenvolvida nesta pequena cidade da Itália, a abordagem tem como premissa a criação de ambientes educacionais com a oferta de uma grande diversidade de materiais e uma grande preocupação estética para instigar os sentidos. É necessário oferecer diversas opções e organizá-las de forma atrativa para possibilitar muitas combinações de forma livre e espontânea. Esta é uma consigna [pedido que estimula o aprendizado e a reflexão] primordial do trabalho na escola a partir da abordagem reggiana. O espaço é o disparador, o terceiro educador, para a criação e a investigação, deixando  aberta para a criança a composição de relações e do uso destes materiais. 

Em um espaço criado para o desenho, por exemplo, os papéis precisam estar cuidadosamente expostos para a exploração das crianças. Entre eles, papéis de embrulho, papéis de presente, materiais absorventes, como papel toalha, filtro de café e papel manteiga, além dos papéis mais comuns no ambiente escolar, como papel sulfite, papel canson, cartolina, papel ondulado, papel vegetal e papel milimetrado. Lixa, papelão e até mesmo papel carbono também são materiais que, além de serem um suporte para o desenho, também podem servir como instrumento.

“O espaço é o disparador, o terceiro educador, para a criação e a investigação, deixando  aberta para a criança a composição de relações e do uso destes materiais” 

A organização desses materiais, dispostos com o mesmo grau de importância e cortados em formatos diferentes, incentiva a criação de conexões e estimula que a criança tenha novas ideias sobre o que desenhar. Da mesma forma, os materiais riscantes devem ser apresentados de maneira a criar um comichão para experimentá-los. Canetas hidrocor de diferentes pontas, marcadores, lápis de diferentes densidades, pedaços de carvão, tijolo, giz pastel oleoso e seco, nanquim e pincéis finos, palitos, pedaços de bambu e madeira são exemplos de materiais estimulantes. Quase todos pretos, cinzas ou marrons, para reforçar o desenho como objeto de estudo, e não a cor que se refere mais à pintura.  

Por outro lado, o espaço voltado ao desenvolvimento e pesquisa em pintura é bastante diferente. Quando falamos em pintura, falamos em cor, área, massa e textura. Assim, além da conhecida e familiar tinta guache, é importante dar possibilidade de transformação dessa tinta de maneira a dialogar com outros materiais.  

Uma bancada com diversos impregnantes, como tinta guache, aquarela, corantes, nanquim e canetinhas, precisam co-habitar com colas líquidas, areia, talco e água, para que se possa transformar e compreender a cor como massa sobre uma superfície. Além disso, ter papéis transparentes coloridos, como acetatos e papel celofane, também possibilita explorar as relações cromáticas pelo acúmulo e por sobreposições.

“Uma boa maneira de mensurar se seu trabalho teve sucesso é observar se você, educador, consegue se sentir estimulado a criar e a explorar no espaço que organizou” 

Os instrumentos para pintar também podem fugir do pincel. É importante ter à disposição cotonetes, esponjas, feltro grosso, algodão, palitos, garfos e também materiais para que a criança possa construir o seu próprio pincel, utilizando gravetos, folhas e tecidos. Enfim, tudo o que estiver disponível e que possa aguçar a sua pesquisa.  

É fundamental ter em mente que esta abordagem tem como objetivo possibilitar que a criança seja protagonista de seu aprendizado. Por isso, é necessário que ela tenha o máximo de possibilidades para ela mesma estabelecer relações. Entretanto, o educador, que é o proponente desta investigação, também precisa ter os objetivos definidos e claros para que possa conceber um ambiente para o aprofundamento, e não para a dispersão.  

O leque de escolhas precisa ser vasto, porém é necessário que tenha uma intenção na sua composição. Assim, uma boa maneira de mensurar se seu trabalho teve sucesso é observar se você, educador, consegue se sentir estimulado a criar e a explorar no espaço que organizou. Se a sua resposta for positiva, isso significa que este espaço está rico o suficiente para a pesquisa, investigação e o aprendizado das crianças. 

* Conteúdo produzido e editado pelo Porvir.

DAYENE MARI 

Artista plástica e arte-educadora formada pela Unicamp em 2004, está concluindo a pós-graduação em Livro para a Infância na Casa Tombada. Com vasta experiência de ensino e mediação em diversas escolas e institutos, já fez parte da equipe pedagógica do SESC, do Instituto Tomie Otakhe, da Pinacoteca do Estado, do Instituto Sidarta, do Museu de Arte Contemporânea de Campinas, e do Ateliê Apucarana, espaço que criou para desenvolver uma maneira mais livre e intimista de criação artística. Pesquisa e trabalha a abordagem de reggiana há anos, e  participou de diversos cursos e seminários no Brasil, na Argentina e em Reggio Emilia, na Itália. Em paralelo à seus projetos artísticos, desde 2009 dá aula no ensino formal e desde 2011 é professora de artes do Colégio Renascença, desenvolvendo uma pedagogia focada na criança. 

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